ERC dá razão à Gazeta das Caldas em queixa contra o Ministério do Ambiente (do anterior governo) sobre a Lagoa de Óbidos

1
793
- publicidade -

notícias das CaldasNuma deliberação agora tornada pública, e que publicamos na íntegra, o Conselho Regulador da Entidade Reguladora para a Comunicação Social deliberou reconhecer a procedência de uma queixa apresentada pela Gazeta das Caldas contra o então Ministério do Ambiente por violação do direito de acesso às fontes e recomenda aquele ministério (hoje com novos inquilinos e com o nome Ministério da Agricultura, do Mar, do Ambiente e do Ordenamento do Território) que, no futuro, respeite “de modo pontual e integral o direito de acesso às fontes de informação legalmente assegurado aos jornalistas”.

Esta queixa teve origem na falta de informação sobre a prevista dragagem da Lagoa de Óbidos, que acabou por não avançar no governo anterior.
O gabinete de imprensa do ministério agora dirigido por Assunção Cristas disse à Gazeta das Caldas que este “está a acompanhar a situação e empenhado em conseguir o rápido início das obras  necessárias para a resolução deste problema”. No entanto, refere, “nesta época do ano não é de todo conveniente iniciar trabalhos – em plena estação balnear – pois poderia comportar riscos para a segurança de pessoas e bens”.

- publicidade -

Conselho Regulador da Entidade Reguladora para a Comunicação Social

Deliberação 5/DJ/2011
Assunto: Queixa de Carlos Manuel Marques Cipriano contra o “Ministério do Ambiente e do Ordenamento do Território” (hoje, “Ministério da Agricultura, do Mar, do Ambiente e do Ordenamento do Território”) por violação do direito de acesso às fontes de informação assegurado aos jornalistas.
I – Identificação das partes
1. Deu entrada na ERC, em 12 de Abril de 2011, uma queixa subscrita por Carlos Manuel Marques Cipriano (doravante, também designado Queixoso), contra “Ministério do Ambiente e do Ordenamento do Território” (hoje, “Ministério da Agricultura, do Mar, do Ambiente e do Ordenamento do Território”, doravante, também abreviadamente designado por “MAOT” ou Denunciado), por alegada violação, por parte desta Entidade, do direito de acesso às fontes de informação assegurado aos jornalistas, consagrado no artigo 8.º do Estatuto do Jornalista, aprovado pela Lei n.º 1/99, de 13 de Janeiro, republicada pela Lei n.º 64/2007, de 6 de Novembro.

II – Os factos
2. Em síntese, alega o Queixoso:
a. «Enquanto jornal regional, a Gazeta das Caldas [onde o queixoso é jornalista] tem acompanhado desde sempre (1925) os problemas da Lagoa de Óbidos»;
b. «Um dos graves problemas daquele habitat natural é o assoreamento», esperando a população local há vinte anos por uma dragagem da lagoa;
c. No dia 14 de Março de 2011, constatada a presença de «uma draga colocada, em seco, junto ao cais da Foz do Arelho», telefonou «ao assessor de imprensa do Ministério do Ambiente, Dr. Ricardo Pires, pedindo informações sobre o assunto» que não foram prestadas, limitando-se aquele «a dizer que quando o Ministério tive[sse] novidades, que as comunicaria»;
d. «No dia 24 de Março, e porque a draga continua[sse] no mesmo sítio e as pessoas se interroga[ssem] sobre o que se estava a passar, envi[ou] um mail ao referido assessor a pedir novamente informações sobre as dragagens e, sobretudo, sobre o concurso público que já teria sido realizado e que [tinha levado] à colocação [no local] de uma draga pertencente à empresa Irmãos Cavaco, SA». Ficou outra vez sem resposta.
e. Nos dias 28 e 29 de Março de 2011 enviou «segundas vias do mesmo mail, desta vez com conhecimento do Dr. Luis Morbey, chefe de gabinete da Sra. Ministra do Ambiente»;
f. «Nesse mesmo dia telefon[ou] várias vezes para o Gabinete da Ministra», sendo sempre remetido para a assessoria de imprensa;
g.No dia 31 de Março, enviou «um mail com o mesmo conteúdo dos anteriores (com conhecimento ao Gabinete da Ministra e ao Gabinete do Primeiro Ministro), reiterando o interesse da Gazeta das Caldas em obter respostas para um assunto que se arrastava há duas semanas»;
h. No dia 4 de Abril voltou «a repetir as questões através de um mail enviado ao assessor Dr. Ricardo Pires»;
i. «Mais uma vez não houve resposta.»
j. No dia 5 de Abril, fechando mais uma edição da “Gazeta das Caldas” sem informações relevantes para os seus leitores, decidiu apresentar a queixa que ora se aprecia.
3. Notificado o MAOT para se pronunciar sobre a queixa apresentada, veio este dizer, em 3 de Maio de 2011:
a. Que na data da sua resposta (3 de Maio de 2011), o “Instituto da Água, IP” se encontrava «a aguardar o visto do Tribunal de Contas ao Contrato de Empreitada de Emergência para a Dragagem de Manutenção para Desassoreamento do Canal Norte da Lagoa de Óbidos, procedimento (…) imprescindível para a execução da empreitada…»;
b. Que «[u]ma vez obtido o visto, bem como finalizados todos os procedimentos necessários, [seriam] acordadas (…) as (…) medidas a tomar»;
c. Que o objectivo da acção era «melhorara circulação de água fluvial e marítima ao longo do canal principal da Lagoa, contribuindo para a melhoria da qualidade da água e para a estabilização da embocadura na parte central do cordão dunar e rebustecer este tanto na frente marítima como nas margens da lagoa.»

III – Pressupostos processuais e diligências adicionais

4. As partes são legítimas. Os prazos legais de exercício do direito de queixa foram respeitados. O Denunciado respondeu também dentro do prazo de que dispôs para o efeito. A ERC é competente, não havendo, por conseguinte, quaisquer excepções substantivas ou adjectivas que obstem ao conhecimento de mérito do objecto do presente procedimento.
5. Em 29 de Junho de 2011, e depois de uma primeira tentativa frustrada, por força das férias do representante do MAOT, realizou-se a tentativa de conciliação prevista no artigo 57.º dos Estatutos da ERC (doravante, EstERC), aprovados pela Lei n.º 53/2005, de 8 de Novembro, não sendo possível lograr qualquer acordo entre ambas que pusesse termo ao diferendo que aqui as opõe.

IV – Direito aplicável

6. As normas aplicáveis ao caso vertente são as previstas no artigo 8.º do Estatuto do Jornalista, aprovado pela Lei n.º 1/99, de 13 de Janeiro, republicada pela Lei n.º 64/2007, de 6 de Novembro (doravante EJ), em conjugação com o disposto no artigo 8.º, alínea a) dos EstERC.

V – Análise e fundamentação

7. Estando em causa informação relativa a uma obra de dragagem na Lagoa de Óbidos de inequívoco relevo para a população local e para os numerosos turistas que frequentam a lagoa, e estando, por outro lado, o MAOT vinculado, nos termos do n.º 1, do artigo 8.º, do EJ, a facultar aos jornalistas o acesso à informação relevante de que disponha e às respectivas fontes, restringe-se o âmbito do presente procedimento à apreciação do modo como esse dever foi cumprido no caso que motivou a queixa actual do jornalista Carlos Cipriano.
8. Não nega o Denunciado os factos e a ausência de resposta às solicitações do Queixoso. Na sua oposição, de resto, mais do que questionar e contestar as alegações deste, limita-se o MAOT a indicar a informação que sobre o assunto estaria em condições de fornecer, sem, no entanto, afirmar tê-la facultado antes ao Queixoso.
9. Sobra, portanto, o facto – admitido até por confissão tácita – que o Denunciado não facultou a um jornalista a informação que este lhe solicitou, nem fundamentou a recusa de prestação dessa informação, como lhe impunha o número 4 do citado artigo 8.º do EJ.
10. Não se vislumbra, por outro lado, qualquer interesse público relevante que a ERC deva conhecer oficiosamente e que – por força do disposto no artigo 62.º, n.º 1, do Código do Procedimento Administrativo – pudesse impedir o Denunciado de prestar as informações solicitadas. Pelo contrário, estando em causa um vulgar contrato de empreitada de obra pública, não integrado por quaisquer elementos classificados, nos termos do artigo 66.º do Código dos Contratos Públicos, essas informações são, pela sua própria natureza, de carácter público, não reservado.
11. Face ao exposto, e sem necessidade de quaisquer considerações adicionais, forçoso é concluir que o Denunciado ofendeu o direito de acesso dos jornalistas à informação, consagrado no artigo 8.º do respectivo Estatuto.

VI – Deliberação

Tendo apreciado uma queixa de Carlos Manuel Marques Cipriano contra o “Ministério do Ambiente e do Ordenamento do Território” (hoje, “Ministério da Agricultura, do Mar, do Ambiente e do Ordenamento do Território”) por violação do direito de acesso às fontes de informação assegurado aos jornalistas, o Conselho Regulador delibera, ao abrigo do disposto no artigo 8.º, alínea a), dos Estatutos da ERC, aprovados pela Lei n.º 53/2005, de 8 de Novembro:

1. Reconhecer a procedência da queixa apresentada, declarando não ter o então “Ministério do Ambiente e do Ordenamento do Território” dado cumprimento ao dever de informação a que estava vinculada, não facultando ao Queixoso o direito de acesso à informação que este solicitou e que lhe é conferido pelo artigo 8.º, do Estatuto do Jornalista;
2. Sublinhar a importância de que se reveste numa sociedade democrática o acesso à informação enquanto elemento indispensável para a formação de uma opinião pública livre e esclarecida e instar o “Ministério do Ambiente e do Ordenamento do Território” (hoje, “Ministério da Agricultura, do Mar, do Ambiente e do Ordenamento do Território”) a, no futuro, respeitar de modo pontual e integral o direito de acesso às fontes de informação legalmente assegurado aos jornalistas.

Lisboa, 7 de Setembro de 2011

O Conselho Regulador,

José Alberto de Azeredo Lopes
Elísio Cabral de Oliveira
Maria Estrela Serrano

- publicidade -

1 COMENTÁRIO