«Os dias não estão para isso» de Nuno Costa Santos

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Partindo de citações de versos de Fernando Assis Pacheco, Alexandre O´Neill e um conto de Raymond Carver, o poema-chave deste livro de Nuno Costa Santos (n.1974) é o da página 18 («Os dias não estão para isso») porque os dias de hoje não estão para aquilo a que se convencionou chamar «a transcendência». O poeta vive, uns após outros, o «ranço dos meses horizontais» e convive com os casais que são fantasmas imobiliários – «São como fantasmas / cansados de subir / quatro andares sem elevador».
Os dias de hoje são insólitos, as flores e a morte lado a lado: «No dia em que a televisão revelava uma nova hemorragia terrorista, desta vez em Madrid, uma antiga empregada fez sem aviso uma visita e espalhou pela casa flores do seu jardim de Fernão Ferro.» Um pouco à maneira de Cesário Verde que procurava na Poesia «A perfeição das coisas», Nuno Costa Santos procura decifrar «em cada relance, / o fim das coisas».
A vida está afinal em todo lado («Abre todos os dias / o tablóide à procura de / uma notícia com o seu nome») tal como a morte: «Escondia ainda a doença nessa primeira vez que chegava das ilhas». É essa oscilação entre vida e morte, entre luz e sombra, entre júbilo e amargura, essa re-ligação que os poemas inscrevem em todas as páginas deste livro. E que o poema da página 45 resume: «Não esperes que te amem. / Não esperes que te aprovem / pela escrita e pela vida. / Lembra-te que na dúvida / as pessoas não amam. / Que antes da dúvida / há muitos territórios / e nenhum deles é o amor.»
(Editora: Livramento, Grafismo: José Albergaria e Júlia Vieira)

José do Carmo Francisco