Leitores de Cascais viajaram às Caldas da Rainha em busca da geografia da “Redenção das Águas”

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FD1grupoPavilhaoVieram de comboio e passaram o dia a visitar o património da região. Foram 30 leitores da Comunidade de Leitores de Cascais que quis vir conhecer os locais que fazem parte da geografia do livro “Redenção das Águas”, de Carlos Querido.  Guiados pelo autor, os visitantes estiveram nos locais onde D. João V e a sua comitiva passaram e viveu durante as estadas da realeza nas Caldas, por causa das suas termas. A visita terminou ao final do dia, com o regresso a Lisboa, também de comboio. Todos prometeram regressar às Caldas da Rainha.

Chegaram de manhã à cidade para um dia inteiro de visitas tendo por base o roteiro do próprio livro. Segundo Carlos Querido, este percurso “coincide com o roteiro dos símbolos da água na nossa região”, e foi esse o passeio que o próprio autor preparou para a comunidade visitante.
Os leitores de Cascais reúnem-se todas as últimas sexta-feiras do mês e do seu plano anual fez parte a leitura e debate desta obra do autor caldense. Estão, pois, a par da fé inabalável nos poderes curativos que D. João V  possuía nas águas termais das Caldas.
Primeiro estiveram nos locais onde o rei e a rainha se hospedaram nas várias “peregrinações” à cidade, tendo de seguida contemplado o Chafariz das 5 Bicas, onde se encontra a inscrição latina que invoca a água “saudável por benefício do céu, perene por mercê do Rei”. Dali os visitantes passaram pelo Jardim da Água, a intervenção cerâmica de Ferreira da Silva. Para Carlos Querido, esta obra de arte pública “é uma fascinante homenagem à cidade, centrada na sua génese de água e de barro, uma obra infinitamente em construção, como a de Gaudí”.
Autor e leitores desceram ao Palácio da Rainha (Museu do Hospital e das Caldas) de onde se avista a Igreja de Nossa Senhora do Pópulo e o Hospital Termal, que foram depois igualmente visitados, desta vez pela técnica daquele museu, Dora Mendes. Seguiu-se a travessia do Parque, contornando o lago onde se reflectem os Pavilhões que já acolheram várias associações e escolas. “No fundo já receberam vários tipos de projecto, tudo menos aquilo para que foram projectados”, comentou o autor ao grupo.
“Toda a viagem e percurso estão a ser muito agradáveis”, disse à Gazeta das Caldas Manuel Nunes, o responsável pela Comunidade de Leitores de S. Domingos de Rana. O formador da área de Literatura contou que a chegada de comboio às Caldas foi “uma estreia absoluta e ver aquelas rãs todas ao pé da estação foi muito engraçado e inesperado”. Entre as visitas da manhã, o responsável salientou a piscina da Rainha no Hospital Termal.
Segundo Manuel Nunes, este grupo é conhecido por – após feita a leitura – “partir à descoberta da geografia dos livros e dos próprios autores”. Já estiveram, por exemplo, na Madeira, “a  reboque do poeta Cabral de Nascimento” e nos Açores “no seguimento da leitura do Mau Tempo no Canal de Vitorino Nemésio”, e em Portalegre por causa de José Régio.
Sobre a Redenção das Águas, Manuel Nunes afirmou que “é um fresco muito interessante desse tempo histórico e logo imaginámos a possibilidade de vir às Caldas conhecer estes locais”. Segundo o formador, ler as obras “é muito bom” mas ir aos locais comer, passear e desfrutar “é muito melhor”.

PARAGEM PARA ALMOÇO

Uma paragem agora para almoço, num dos restaurantes situados nas imediações do Parque. No Selim há agora um novo conviva que se junta à comitiva: o presidente da Câmara. Para Tinta Ferreira, esta iniciativa de seguir o roteiro do livro “é fantástica porque resulta de uma obra de um caldense sobre a estadia de D. João V nas Caldas”. O edil disse que “a ideia de um clube de leitores que explora uma obra e vai atrás da mesma ou do autor e que na sua senda vem visitar os próprios espaços é muito interessante”.
Para Tinta Ferreira, “Caldas da Rainha tem muita coisa para ser visitada e conhecida e a nós compete-nos acolher bem e ser hospitaleiros como a  Rainha nos disse para sermos de forma a que as pessoas queiram voltar”, rematou.
Depois do repasto, a comitiva partiu em vista para a Quinta das Janelas, onde se hospedou e faleceu o Infante D. Francisco. “Neste espaço aguardava-nos um belíssimo painel que representa Moisés a fazer brotar a água do rochedo de Horeb, em pleno deserto”, salientou o autor. Os visitantes ainda tiveram a oportunidade de visitar a ruína dos antigos balneários termais naquele espaço.
Num autocarro, cedido pela Câmara das Caldas, os visitantes seguiram para a Igreja do Senhor da Pedra, onde o rei D. João V parava para orar. A visita seguiu para a Foz do Arelho e contou com a participação da antropóloga Teresa Perdigão na contextualização sobre a vida na vila. Visitou-se ainda a Quinta da Foz, onde ficou instalado o Infante D. Manuel.

UMA ROTA COM BASE NOS LIVROS DE HISTÓRIA LOCAL

“Foi uma viagem de comboio muito animada até às Caldas pois ocupámos quase toda uma carruagem”, disse Anabela Carvalho, de 54 anos. Esta magistrada, que faz parte da Comunidade de Leitores de Cascais, contou que entraram na automotora no Cacém e que vieram sempre muito animados, comendo bolinhos e fotografando todo o percurso. ”O tempo está maravilhoso e só temos pena de não ver a Praça da Fruta recomposta no seu lugar”, disse a visitante. O bibliotecário David Freitas salientou a passagem pela Praça da Fruta e a intervenção de Ferreira da Silva. O leitor, de 38  anos, gostou de conhecer o Hospital Termal e de ver os Pavilhões do Parque, “apesar destes estarem em ruínas”.
A economista Maria José Correia, 55 anos já conhecia as Caldas mas por causa do livro resolvemos fazer uma viagem clássica de comboio. “Parecíamos um bando de miúdos, bem-dispostos e animados a fazer a viagem de comboio. Ninguém falhou à hora marcada e mudámos em Mira Sintra. A carruagem era praticamente só nossa!”, informou a visitante.
A arquitecta Maria Amélia Cabrita, 60 anos, gostou de viajar de comboio sobretudo porque representou “a oportunidade de rever várias estações de comboio pois eu dei aulas no inicio da carreira na Malveira”. A visitante salientou o Hospital Termal, sobre o qual acha que é preciso agir para que a sua recuperação seja possível. “Estas iniciativas são importantes para a história e para a memória dos próprios locais. As gerações mais novas acabam por esquecer um pouco as suas origens”, disse. Maria Amélia Cabrita considera que uma rota relacionada com os livros de história local “faria todo o sentido e teria grande receptividade turística”.
Para Custódia Coroa, de 56 anos, a viagem de comboio não podia ter corrido melhor pois “as estações são deliciosas e ter visto o castelo de Óbidos do outro lado foi muito interessante”. A também secretária permanente da Federação Portuguesa de Natação considera que é “uma pena o Hospital Termal estar desactivado, temos que tentar recuperar este lugar! È um local fantástico”.

Natacha Narciso
nnarciso@gazetadascaldas.pt