Joana Pinheiro
Coimbra
32 anos
Hovmantorp – Suécia
Coordenadora de projectos
europeus na ONG Projektor
Percurso escolar:
Escola Básica D. João II,
Escola Secundária Raul Proença,
Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra
O que mais gosta do país onde vive?
Uma das coisas que acho mais interessantes na Suécia é a relação entre as pessoas e a natureza. Os suecos desfrutam como poucos da culturas do espaço ao ar livre, seja qual for a estação do ano, faça sol ou neve. No inverno as pessoas não deixam de ir de bicicleta para o trabalho e alguns lagos tornam-se pistas de patinagem no gelo.
No Norte do país é comum fazerem-se fogueiras sobre os lagos gelados e passar uma tarde à volta do fogo, num piquenique invernal com toda a família. A semana que equivale ao Carnaval em Portugal é, na Suécia, dedicada ao desporto. Assim, nos dias em que, em Portugal, nos mascaramos e pregamos partidas, na Suécia as escolas fecham e muitos pais tiram dias de férias para esquiar e passar uns dias na montanha com os filhos.
Na primavera vem a febre das plantas. Todo o sueco que se preze tem o seu cantinho de plantas, mesmo que isso signifique ocupar a minúscula varanda do apartamento com girassóis, morangos e toda a espécie de especiarias.
No verão, são comuns as excursões na floresta para apanhar frutos silvestres e cogumelos. Algo que prova bem esta relação com a natureza é o direito do Allemansrätt (direito público de acesso à natureza), que confere a todas as pessoas o direito de usufruírem do espaço natural na Suécia. É permitido acampar, colher frutos, fazer fogueiras e piqueniques e caminhar por qualquer lugar no país.
Esta relação com a natureza justifica, em parte, o interesse generalizado pelo meio ambiente e pelo desenvolvimento sustentável, que tanto caracteriza a Suécia. Muitos municípios apostam cada vez mais em medidas amigas do ambientes a nível, por exemplo, dos transportes públicos. A reciclagem é uma prática assumida por toda a população sueca e nos supermercados encontra-se sempre uma grande variedade de produtos biológicos.
A Suécia é um país de contrastes. Encontram-se frequentemente extremos de costumes, em que os hábitos de um país que já foi pobre e rural persistem e coexistem com os novos hábitos de um país moderno, desenvolvido, tolerante, aberto e multi-cultural. Não é raro encontrar um grupo de amigos e familiares de países diferentes a celebrar o Midsommar (celebração do Solstício de verão) com coroas de flores na cabeça e a cantar músicas tradicionais suecas à volta de uma mesa que contém tudo o que manda a tradição.
O que menos aprecia?
Em termos de desafios pessoais na Suécia, neste momento o mais difícil é sobreviver a um inverno numa região com longos períodos de chuva. Os primeiros anos vivi-os no norte do país, na Lapónia sueca, onde nevava todo o inverno e a paisagem tornava-se assim, muito mais clara e alegre. Por isso, tem sido difícil adaptar-me ao clima do sul, com muitos dias de chuva, escuros e enevoados. A vida no inverno torna-se assim muito caseira, mas obriga a um esforço da imaginação para inventar passatempos. À custa dos invernos em Småland já desenvolvi uma série de aptidões, desde tricot a kickboxing.
De que é que tem mais saudades de Portugal?
De Portugal tenho saudades da família e dos meus amigos. E do bom queijo, que é coisa que aqui não há. No entanto, e como diz a minha mãe, do longe se faz perto, e com as possibilidades que as novas tecnologias dão hoje em dia, é possível matar parte das saudades mantendo, por exemplo, uma longa conversa através do Skype.
Quanto às saudades do bom queijo e de outras especialidades gastronómicas portuguesas, a encomenda que regularmente recebo pelo correio tradicional ajuda a resolver o problema.
A sua vida vai continuar por aí ou espera regressar?
Não ponho de parte a hipótese de voltar um dia para Portugal. No entanto, neste momento, gosto de viver na Suécia e encontrei aqui uma segunda casa.
“Eu gosto imenso de comida sueca e acho até que tem muito em comum com a nossa comida portuguesa”
Tal como o de qualquer sueco, o meu dia-a-dia e o meu tempo livre são determinados pelo clima e pela estação do ano, que, aqui, são muito distintas, tanto em termos da paisagem que geram como das actividades que proporcionam. Os invernos são mais caseiros e os Verões são passados fora, com banhos nos lagos, passeios de bicicleta e jantares no exterior na companhia de amigos.
A gastronomia sueca não é famosa entre os estrangeiros aqui residentes, até porque é difícil encontrar comida tradicional nos restaurantes (onde há muita comida internacional).
Eu gosto imenso de comida sueca e acho até que tem muito em comum com a nossa comida portuguesa. A maior diferença está no molho adicional que todos os pratos suecos têm: não há peixe nem carne sem molho!
No Norte do país é comum o consumo de carne de rena, alce e outros animais que vivem em liberdade e há muita comida à base de farinha.
Os pratos vegetarianos e vegans estão vulgarizados e fazem parte do menu de qualquer restaurante. No geral os restaurantes não são baratos e por isso, aqui, tenho menos o hábito de comer fora do que quando estou em Portugal.
Tal como para os portugueses, a comida é muito importante na cultura sueca. Lembro-me, por exemplo, da minha primeira aula de sueco cujo tema foi “A importância do pequeno-almoço” e na qual estivemos duas horas a falar sobre esta refeição. Outra coisa curiosa é que em muitos locais de trabalho existem, formalmente, duas pausas para café por dia. Durante 20 minutos todas as pessoas param de trabalhar e juntam-se para conversar, comer e beber um café, normalmente na zona social do local de trabalho.
Relativamente à minha vida profissional, eu trabalho numa organização sem fins lucrativos em Växjö que desenvolve projectos sociais e inovadores na região.
Neste momento temos projectos ligados à integração de jovens que vieram recentemente para a Suécia sob asilo político. Trabalhamos também com a promoção do acesso ao mercado de trabalho por parte de pessoas com deficiências físicas e estamos a finalizar um projecto no qual criámos filmes de apoio para aulas de educação sexual nas escolas. É uma associação jovem e criativa onde há espaço para novas ideias num ambiente muito informal e com muita diversidade cultural. O meu papel na organização é coordenar o departamento internacional, onde trabalhamos com iniciativas Europeias para jovens, tais como voluntariado, intercâmbios, cursos e seminários.
O meu interesse nesta área sempre existiu desde que fiz Erasmus em Itália. Foi também a curiosidade em conhecer outras culturas que me levou mais tarde a fazer um estágio na Suécia e depois ficar por cá.
Eu moro a cerca de 25 km da cidade onde trabalho, numa pequena vila com vida de aldeia chamada Hovmantorp. O meu dia-a-dia é de contrastes: por um lado, trabalho numa associação cujo objectivo é despertar consciências e criar mudanças na sociedade, por outro, vivo numa vila muito pacata, com 8000 habitantes. O ponto alto da minha semana em Hovmantorp é a alegre sauna feminina das sextas-feiras, onde eu sou das poucas utentes com menos de 65 anos, e onde se discutem os últimos acontecimentos da localidade. Joana Agria Pinheiro