Da parte e do todo

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A parte e o todo acabam por ser indissociáveis, porém, muitas vezes, o respectivo tratamento tende para a separação, isto é, a tal questão bem conhecida de ver a árvore e não a floresta; ou vice-versa…
Esta crónica assume já partir do geral para o particular, falando da política do governo deste país à beira-mar desterrado («O meu país é aquilo que o mar não quer», verso de Ruy Belo), para vir ao restrito terreno das incidências específicas nesta terra que foi de águas-mornas e hoje é de águas paradas.
No horizonte estão eleições. Legislativas, bem entendido. O frenesim das presidenciais, criado pelas agências de comunicação, com candidatos para todos os gostos e feitios, visa apenas, como é óbvio, um objectivo político preciso: desviar atenções da actuação do governo, pondo-o a salvo de críticas incómodas e para si prejudiciais. É neste contexto que ministros e sua máquina de propaganda com difusores de opinião estipendiados, apregoam o sucesso do reajustamento, segundo eles, inevitável e inexorável, quando a verdade é que se gabavam de «querer ir para além da Troika» e esse empenhamento (digo bem), ter desencadeado um abalroamento económico e social cujos resultados concretos resultam num facto que não pode ser iludido nem ignorado: A dívida disparou, passando, em 4 anos, de 90% para mais de 130% do PIB! As decisões austeritárias levaram ao descalabro que gerou recessão, destruição do sistema produtivo, desemprego, tudo constatável em números – perto de 3 milhões de pessoas a viver na pobreza, 485 mil portugueses emigrantes num fluxo maior do que o pico verificado nos anos 60, 13% de desempregados, visão oficialmente manipulada, a mascarar a dura realidade de ser a taxa efectiva pelo menos superior em 3 a 4 pontos percentuais, dado omitir aqueles que deixaram de receber subsídio e os camuflados em falsos estágios e pífias formações, não falando desses que entretanto saíram para trabalhar no estrangeiro.
Ora cá no burgo, as sequelas destes desmandos sofreram-se numa flagelação que abriu feridas cuja cicatrização não se sabe como nem quando ocorrerá:
Na Saúde, as Urgências são uma das 6 piores do país. As promessas de intervenção não passam disso, enquanto vão sendo extintas valências do SNS. O Hospital Termal, matriz e motor económico da cidade, foi encerrado de forma preconceituosa e deliberada, após um longo período de desinvestimento e desorçamentação. As declarações da tutela avolumam um chorrilho de asneiras, desde a alusão aos pavões que nunca existiram, à desastrada referência do Secretário de Estado ao «core business», apoucando assim a Saúde como um mero negócio, passando pelo relatório que, subestimando as virtudes terapêuticas das águas termais das Caldas recomendava a entrega a uma unidade de gestão privada de vocação hoteleira, até à caricata afirmação de ser «enganosa» a designação de Hospital Termal, o que comprova toda a má-fé que tem envolvido este processo.
Na Educação, foi posto em marcha um ataque à Escola Pública e aos seus profissionais, em paralelo com o favorecimento do privado.
A linha do Oeste permanece em agonia, desprezada a sua importância estratégica na perspectiva do desenvolvimento da região.
A Lagoa, poluída, é alvo duma tardia e pontual acção de desassoreamento, quando era imperioso haver finalmente uma operação de fundo. Anuncia-se, para 2016, uma segunda fase, ainda sem projecto, que ninguém pode garantir que vá mesmo acontecer.
Na Cultura, pretende-se a municipalização dos Museus Malhoa e da Cerâmica, o que, a confirmar-se, redundará numa indesmentível despromoção.
É necessária uma outra política que não esta decorrente dum fanatismo ideológico, o qual, comprovadamente, amputa o futuro aos cidadãos e vende Portugal à peça e a pataco.
Da parte e do todo, da árvore e da floresta se falou pois. Só que a árvore perdeu a seiva e a floresta, como bem viu Gil Vicente, é apenas de enganos.

José Carlos Faria
jcrffaria@gmail.com

1 COMENTÁRIO

  1. Muito obrigado pelas tuas palavras, José Faria,
    Dão-me um prazer, um gosto que só as minhas lágrimas sabem entender.Espero que os teus dedos continuem firmes por muitos anos ou que a quantidade de tinta da tua caneta seja igual á de um oceano.
    Obrigado, porque há sempre alguém que resiste.
    Joaquim Marques