Ernâni Lopes sepultado em S. Martinho do Porto

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Nas comemorações do Dia Internacional do Mar, Ernâni Lopes falou publicamente pela última vez na vila que escolheu para última morada

Não eram raras as vezes em que Ernâni Lopes dizia publicamente que era em São Martinho que gostava de ter a sua última morada e que ali tinha adquirido um jazigo, ainda antes de comprar uma casa de férias. E a vontade do antigo ministro das Finanças cumpriu-se na passada sexta-feira.
Aos 68 anos, Ernâni Lopes faleceu, depois de anos a lutar contra um cancro. A notícia da morte de um dos mais respeitados economistas portugueses suscitou desde logo reacções dos mais diversos quadrantes políticos e não faltaram elogios ao homem que nos anos 80 negociou com o FMI e impôs em Portugal um pacote de medidas austeras, entre as quais a criação de um imposto extraordinário no 13º mês. Conhecido por ser um homem firme, Ernâni Lopes nunca se afastou por completo da política, nem que fosse como comentador, um posto que ocupava sem papas na língua. Nas cerimónias fúnebres que tiveram lugar na Igreja das Mercês, em Lisboa, juntaram-se dezenas de personalidades portuguesas. Um cenário diferente das cerimónias que tiveram lugar em São Martinho do Porto. A família tinha pedido uma cerimónia íntima, e assim foi. No cemitério da vila terão estado cerca de três centenas de pessoas, entre populares, amigos próximos e familiares do economista, mas não houve presenças mediáticas.
A ligação de Ernâni Lopes a São Martinho tem na base a família da sua mulher. E o ex-ministro das Finanças foi sempre presença habitual nas ruas da vila balnear, sendo também um orador frequentemente convidado nas iniciativas promovidas por diversas entidades. Ainda no passado mês de Setembro o economista falou sobre o “Hypercluster do Mar” nas comemorações do Dia Internacional do Mar que tiveram lugar na vila. E falou das riquezas que tem São Martinho, da iguaria que é o peixe fresco capturado pelos pescadores locais, de como é preciso potenciar todas as actividades ligadas às águas marítimas, do turismo à indústria, passando pelo desporto e pela gastronomia.
A Economia do Mar era, de resto, aquilo a que Ernâni Lopes mais se dedicava nos últimos tempos. Com um vasto currículo de onde sobressaem os cargos de embaixador de Portugal em Bona e Chefe da Missão de Portugal junto das Comunidades Europeias em Bruxelas, vários cargos de consultor de empresas e governos de diferentes países, nomeadamente da lusofonia, consultor económico do Banco de Portugal, entre muitos outros.
Actualmente era sócio-gerente da SaeR – Sociedade de Avaliação de Empresas e Risco, uma empresa de consultoria económica e financeira criada em 1988, que elaborou em 2004 a Avaliação Estratégica das Condições de Desenvolvimento do Concelho de Alcobaça, ditando a integração do concelho no Oeste. O economista era ainda director e professor do Instituto de Estudos Europeus da Universidade Católica.

O homem que negociou a entrada de Portugal na CEE

A primeira vez que Ernâni Lopes foi notícia na Gazeta das Caldas corria o ano de 1980 e o nosso jornal foi convidado a visitar a Comissão Europeia. Na altura o economista era o embaixador português junto da CEE e foi ele quem negociou a adesão do país à comunidade.
Na altura o diplomata considerou que era humanamente impossível que Portugal aderisse à comunidade em Janeiro de 1983, data que era nessa época a polémica nacional, pois acabaria apenas por entrar na CEE em 1986. A agricultura foi um dos sectores mais abordados pelo economista, que defendeu que “havia muito que fazer, aliás como nos outros sectores, como organizar o sistema de preços agrícolas, melhorar qualitativamente as mercadorias, reestruturar as explorações bem como lançar a contabilidade na agricultura, forma única de beneficiar dos fundos agrícolas da comunidade depois da adesão”, pode ler-se na Gazeta das Caldas de 26 de Novembro de 1980.

Joana Fialho
jfialho@gazetadascaldas.pt